sábado, 9 de agosto de 2014
A “SQUATTERIZAÇÃO” da Mineração no Tapajós
“Squatterização” é uma palavra de origem inglesa que
significa ocupante ilegal. Quando ocorreu a primeira corrida ao ouro da Califórnia,
São Francisco, hoje capital do Estado mais rico dos U.S.A., tudo começou com um
acampamento de garimpeiros atraídos pelas notícias de ouro em uma fazenda
local. O fazendeiro suíço que havia descoberto e desbravado as terras no início
do século passado teve que ir embora e até hoje os seus descendentes procuram
reaver as terras, hoje ocupadas pela linda cidade de São Francisco.
Neste caso
como muitos outros, a sociedade americana, tipicamente baseada no direito, deu
razão de causa aos “Squatters”, admitindo o fato ocorrido. O que ocorre no
Brasil e em particular na Amazônia não é outra coisa.
Empresas se
apossam de dezenas, centenas e até milhões de hectares de direitos minerais
baseados num Código de mineração imperfeito e contornável através de artifícios
legais. Na maior parte dos casos não fazem nada porque se requerer é fácil,
pesquisar é bem menos e os pequenos mineradores, à procura de locais para
trabalhar e instalar os seus equipamentos, depois de tentar requerer
inutilmente as suas áreas de atuação, já legalmente ocupadas, decidem arriscar
a ocupação ilegal esperando que a empresa que nunca apareceu não saberá de nada
ou mesmo sabendo não irá se queixar.
Entram de
mansinho, declarando a quem quiser escutar que seu objetivo é extrair um pouco
de ouro para pagar os custos e sair do blefe. E que se a empresa chegar
solicitando sua saída esta se processará sem problemas. Não tentam enganar
ninguém: no início é sempre difícil, os custos são altos e os pequenos
mineradores estão com dúvidas se o investimento é realmente rentável. Constitui
a primeira fase da “Squatterização”, a instalação, quando o minerador começa a
atrair os amigos e os familiares em função de seu sucesso inicial. Em seguida,
estamos na segunda fase da “Squatterização” a ocupação, quando o minerador
procura negociar com a empresa titular se ela se manifestar, tentando ganhar
tempo enquanto rapidamente os companheiros vão aumentando a ocupação até que o
evento se transforme em corrida, onde os ocupantes devem lutar para resguardar
os seus direitos de pioneiros.
Tem lugar a
terceira fase: A corrida, quando
resguardado pela massa invasora os primeiros ocupantes passam a sentir-se mais
fortes em relação à empresa, não aceitando discutir com ela e procurando lutar
contra os mais fortes dos novos chegados. A empresa então vai procurar os seus
direitos nos órgãos especializados: Justiça Comum, DNPM, Ministério público entre
outros, recebendo muitas palavras de conforto e apoio, raramente havendo ações
práticas. Cada órgão costuma atribuir responsabilidade ao outro.
A área já está “Squatterizada” e como a
autoridade não pode admitir coisa ilegal o Governo procura legalizar o “Squatt”
através de medidas como: fiscalização da compra de minério, podendo inclusive
cassar o direito da empresa no que se refere a Alvarás de Pesquisa, o “Squatt”
se desenvolve, os pequenos mineradores mais importantes tentam se organizar,
mas a classe é particularmente arredia a qualquer estrutura de organização.
Após o término do ouro fácil o garimpo tende a se esvaziar; os garimpeiros irão
seguir outros rumos e fofocas e suatts. Desdobra-se a quarta fase, a do
abandono, na qual os buracos são deixados para traz permanecendo apenas o mito
de riqueza fácil. A empresa, a não ser em casos raros, nem se aproveitará da
liberação da área. O ouro superficial que já se foi e os investimentos para
desenvolver uma mineração subterrânea são elevados demais, talvez com os ganhos
do ouro superficial a empresa teria prosseguido com a lavra subterrânea. De
qualquer maneira o Brasil ganhou algumas centenas de quilogramas de ouro embora
tenha perdido uma jazida de dezenas de toneladas.
Temos de
achar soluções rapidamente para um aproveitamento mineral adequado em função
das características intrínsecas das pequenas jazidas correspondentes à maioria
das existentes na Amazônia e ao senso de pioneirismo que move a jovem sociedade
mineral da região, pioneirismo avesso aos regulamentos burocráticos e agora
incrementados por um número de pequenos empresários do sul do País que têm
encontrado no ouro uma alternativa para a crise econômica que assola o País.
“Squatt” ou pequena mineração são alternativas válidas? é a pergunta que se
impõe, necessitando-se definir as regras do jogo ou pelo menos chegar a uma
solução intermediária clara. As soluções são obviamente políticas; já falamos
dos “Squatt” minerais e vale frisar que também se formam “Squatt” na área
fundiária com ocupações de terrenos ociosos para construções, na área
habitacional com ocupações de casas abandonadas em conjuntos habitacionáveis,
na área comercial com comércios ilícitos, totalmente sonegadores.
Progressivamente está se criando uma sociedade paralela, ou alternativa, como é
chamada em Berlim ou Amsterdam, uma sociedade que passa a recusar as regras da
outra sociedade que se sente forte, e que no caso da Amazônia Brasileira conta
para se desenvolver com um rico fermento social, um extenso espaço físico e o
substancial apoio de muitos políticos locais e nacionais. Devemos procurar
soluções para buscar as causas, analisar os efeitos perversos de medidas
políticas ou administrativas precariamente estudadas e aplicadas de forma
irrealista criando problemas de ordem social, econômica e política.
Se de um lado
o pioneirismo tem valor incontestável para justificar processos de
“Squatterização” em áreas ainda não assumidas, de outro lado uma lei forte e
aplicada justamente, deve garantir os direitos legalmente adquiridos à luz da
Constituição do País, evitando-se uma escalada de ações ilegais que massacrem o
direito da lei em detrimento do exercício da força o que caracterizou no passado
as sociedades primitivas.
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