Ver também: O cabaré do Pelado
Além das gírias garimpeiras que formam um português com terminologias
próprias, há também uma linguagem paralela, um verdadeiro dialeto que
recolhemos por gravação e que apresentamos transcrito "sensu scripto" em negrito
abaixo. Esse dialeto mostra o quanto uma língua pode se desvirtuar rapidamente no
isolamento das comunidades amazônicas e apesar da televisão.
Quando chega a mulher no cabaré
ela se apresenta com um nome de guerra, para o qual ela pretende ser chamada,
mas os garimpeiros criam imediatamente um apelido para cada uma, que da suporte
aos diálogos entre eles:
“Burra de frente” é se se enfeita
muito, “Maria arroz cru”, se é rígida de carne, ou Poção da grota se são
flácidas ou mesmo Maria Serrotão se são magras e mostram o espinhaço dorsal e
assim por diante.
Nos Monchões, a garimpeirama,
enquanto trabalha, faz seus planos para as noites que não são consecutivas e
dependem do ouro que conseguirão ganhar, em voz alta e contestada por alguns
companheiros:
- Hoje, aquela fogoizona de corpo comprido e o cagadô baixo, vai sabé
quantos quilos o Degas aqui pesa.
- E quando o Manezimm só consegue mexer dos
zóios abaixo da anta buxuda.
- Tua lá presta mais pra nada, trem a tôa..
- Insprumental mode tu vê....
- Qua; eu boto até minha irmã, que tudo é quem nem rabo de ovelha...
- A gargalhada é geral em meio a
esse ingenuamente feliz dialogo, que faz do próprio sofrimento um motivo para
rir, como se risse da própria sorte adversa, vivendo meses ermos, dividindo com
antas e onças, condomínio da selva que exploram por conta própria.
Nos cabarés, à noite, os cantores
da moda, de quem eles gostam, os empurram pelos salões poeirentos, cheirando a
suor, pingas e loções baratas, amparados pelas mulheres meio grogues de ice e
cerveja.
- é 5 gramas a chave do quarto,
avisa a mulher ao acompanhante, que essa quantia, afora o lucro das bebidas e a
percentagem do ganho da mulher, formam a renda do mercador de sexo e devem ser
pagos no ato ao cabarezeiro.
E pela manha, a ressaca, quando
não curtida na carga de gonorreia ou sífilis para comer o que sobrou da farra
nas farmácias improvisadas das currutelas garimpeiras.
E a mulherada em rodas faz as
unhas rindo sem nenhuma inocência das carências dos peões envacorados.
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