quarta-feira, 1 de abril de 2015

Detentor de alvará de pesquisa tem direito a indenização por exploração irregular de jazidas

Superior Tribunal de Justiça RECURSO ESPECIAL Nº 1.471.571 - RO (2014/0114268-7) RELATÓRIO O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE: 

Cuida-se de recurso especial interposto por Valdecir da Silva, fundamentado na alínea a do art. 105, III, da Constituição Federal. Compulsando os autos, verifica-se que Madeireira Seu Vital Ltda. propôs ação de reparação de danos materiais, contra o recorrente, em razão da exploração indevida de jazida de minerais, em área anteriormente concedida à recorrida para pesquisas. Em sentença, proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Ariquemes, julgou-se improcedente o pedido (e-STJ, fl. 310/313), ao fundamento de que o pesquisador não teria direito à reparação por lavra irregular de minerais. Dano este, em última análise, suportado pela União, enquanto proprietária do subsolo. O Tribunal de Justiça de Rondônia, à unanimidade, deu provimento à apelação da recorrida, nos termos da seguinte ementa (e-STJ, fl. 164): Apelação cível. Ação de reparação de danos. Nulidade da citação por edital. Ausência de má-fé. Multa inaplicável. Usurpação. Extração ilegal de minérios. Proteção ao jazimento. Reparação por danos materiais devida. Os embargos de declaração interpostos pelo recorrente foram rejeitados. Em recurso especial, o recorrente alega violação dos arts. 3º, 4º, 111, 267 e 301 do CPC. Em síntese, sustenta que o minério de estanho, no subsolo, é bem público da União, de modo que não há direito de particular, sem concessão para lavra mineral, à indenização por sua mineração, mesmo que irregular ou ilegal. Em juízo prévio de admissibilidade, o TJ/RO inadmitiu o recurso especial, dando azo à interposição do AREsp n. 516.600, reautuado para melhor exame da matéria. É o relatório. Documento: 44212614 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 1 de 4 Superior Tribunal de Justiça RECURSO ESPECIAL Nº 1.471.571 - RO (2014/0114268-7) VOTO O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE(RELATOR): Cinge-se a lide a verificar se o particular, amparado por alvará de pesquisa, tem proteção quanto à exploração dos minérios encontrados no subsolo da respectiva área, e, por consequência lógica, direito à reparação pelos danos materiais decorrentes da exploração realizada de forma ilícita ou irregular por terceiros. Primeiramente, convém ressaltar que os fatos – se viável ou não a jazida, bem como se houve ou não sua exploração irregular – são postos de lado pelo recorrente desde a contestação. Dessa forma, a questão objeto do presente recurso está estritamente vinculada ao direito à reparação por danos materiais. Segundo a tese do recorrente, tratando-se as reservas minerais de bens públicos da União, nos termos do art. 20, IX, da Constituição Federal, ainda que existente o alegado prejuízo, a reparação seria devida exclusivamente à União. Essa tese acabou prevalecendo em primeiro grau de jurisdição, porém foi posteriormente afastada, ante a reforma da sentença pelo acórdão recorrido. Com efeito, não há dúvidas de que a CF/88 atribui a propriedade das reservas minerais à União, seguindo uma tendência global ante o manifesto reconhecimento da existência de interesse nacional, bem como da necessidade de gerir recursos finitos de indiscutível relevância estratégica. Contudo, o constituinte nacional, reconhecendo igualmente a importância econômica dos minérios na atividade privada, optou por resguardar a possibilidade de exploração de jazidas por particulares, desde que brasileiros. Nessa busca de conciliação entre os interesses público e privado, garantiu-se ao particular concessionário, nos termos do art. 176 da CF/88, “a propriedade do produto da lavra”. Assim, ainda que o Estado seja o proprietário exclusivo das reservas minerais existentes no solo e subsolo, ao concessionário particular é garantida a propriedade do produto de sua exploração, fazendo emergir da nossa ordem constitucional o princípio do livre acesso aos recursos minerais (FREIRE, William. Código de Documento: 44212614 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 2 de 4 uperior Tribunal de Justiça mineração anotado. 5 ed. Mandamentos editora : Belo Horizonte, 2010. p. 107). Nesse cenário, cumpre identificar a partir de que momento incidirá essa proteção constitucional à propriedade particular dos minérios. A fim de ordenar o acesso franqueado livremente aos particulares, nos termos disciplinados pela Constituição Federal, o Código de Mineração trouxe à lume o importante instituto da prioridade. Assim, cumpridas as determinações legais, o minerador faz jus à obtenção de um título minerário, obedecida a prioridade prevista no art. 11, a, do Decreto-Lei n. 227/67. Para fins de fixação do direito de prioridade, estabelece o referido dispositivo que se tomará em consideração a data do requerimento relativo à pesquisa ou à exploração de área considerada livre. Desse modo, a Autorização de Pesquisa é o primeiro título minerário previsto na legislação e, apesar da denominação, não há para a União qualquer discricionariedade em sua concessão, devendo ser atribuído ao requerente que, cumprindo os requisitos legais, objetivar a exploração futura de área livre. Concedido o alvará de pesquisa e verificada a viabilidade da exploração em conclusão dos trabalhos de pesquisa, o autorizatário terá o prazo decadencial ânuo para requerer a concessão da lavra ou negociar seu direito com terceiros. É o que dispõem os arts. 31 e 32 do Decreto-Lei n. 227/67, ambos com redação dada pela Lei n. 6.403/76: Art. 31. O titular, uma vez aprovado o Relatório, terá 1 (hum) ano para requerer a concessão de lavra, e, dentro deste prazo, poderá negociar seu direito a essa concessão, na forma deste Código. Art. 32. Findo o prazo do artigo anterior, sem que o titular, ou seu sucessor, haja requerido concessão de lavra, caducará seu direito, cabendo ao Diretor-Geral do Departamento Nacional da Produção Mineral - D. N. P. M. - mediante Edital publicado no Diário Oficial da União, declarar a disponibilidade da jazida pesquisada, para fins de requerimento da concessão de lavra. Daí se extrai que, uma vez autorizada a pesquisa para fins de mineração, nasce para o autorizatário o direito subjetivo e exclusivo à futura exploração da mina, como decorrência do direito de prioridade, durante o prazo decadencial de 1 ano, contado da aprovação do relatório final da pesquisa. Resgatando a disciplina constitucional do tema, o domínio da União em relação aos minérios existentes no solo e subsolo, não obsta o direito subjetivo à propriedade do produto da exploração. Ao contrário, assegura-se este direito, em especial, Documento: 44212614 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 3 de 4 uperior Tribunal de Justiça mediante a observância ao direito de prioridade. Desse modo, fixado legalmente o direito subjetivo à futura concessão da lavra como decorrência da autorização de pesquisa, a exploração indevida, exercida clandestina e ilicitamente por terceiro, que não detinha nenhum título minerário, resulta em prejuízo injusto ao legítimo autorizatário. Dano este que, portanto, deve ser-lhe integralmente ressarcido na esteira do art. 927 do Código Civil. À vista do exposto, nego provimento ao recurso especial.

É como voto.

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